Discurso directo enquanto arde uma cavaca na fogueira e ela, a geada "cai" nos campos e serranias...
- Boa noite!
- Santas, que queres tu magarefe a estas horas, coisa boa nao deve ser...
- Era para perguntar da geada, aqui faz frio, mas...
- Tens saudades de acordar e chegar na varanda quando acordas e ver os lameiros todos branquinhos, mas nao te apoquentes que agora no Natal vais ver muita e quem sabe a neve, esta um frio de rachar.
Ainda agora vim de dar de comer as galinhas e "arre que diabo", esta a "cair" uma geada daquelas de ficar meio dia na cama, sempre se poupa lenha e as pernas vao pedindo descanso...
- Cair nao, que ela nao cai, digo...
- Nos teus ossos que andas longe, Afinal nao aprendes.Ora ouve, a orvalhada com o frio de agora que nos tolhe todinhas, coalha, tal como o leite para o queijo.
Vos pouco sabeis daqueles tempos, embora saiba que te lembras de alguma coisa ou outra, eram outros tempos, como aqueles em que o tio Bombo vinha a Forninhos buscar sacos de centeio para moer e trazia a farinha de volta, mas por altura da matacao dos porcos e Natal, quem podia e tinha semeado algum alqueire de trigo, ficava a espera que ele trouxesse moido para as morcelas e sopa daquele dia. Por vezes nao podia vir se a neve o impedisse, mas com a geada e quando o sol abria, dizem que se agarrava ao rabo do cavalo ou mula e escorregava por ali abaixo, ate ao destino. Boas patas tinham os animais e era assim dia e noite. A vida era dura! Bom homem que Deus ja tem...
E ja agora deixa que te diga, seculo e meio atras, ou mais, e tal como as outras e outros, iamos ceifar erva para o gado nos lameiros, no meu caso na Courela das Regadas, de foice na mao e agua pelos joelhos nos sitios onde a geada nao cobria a erva, descalcas!
Mas ruim, aquela chamada de "Negra", mais tardia e que nos mata os rebentos e os frutos, vadia e maldita. Tanta coisa podia contar mas...
Agora e tudo uma America!
Sabes, parece que falar do frio me puxa mais uma cavaca para o lume e sabe bem,
Esta a "cair" uma geada...
Recordações das geadas de lá... E elas podem destruir as plantações. Linda foto! abraços, ótimo fds! chica
ResponderEliminarDe facto a geada nao cai, forma-se, mas nas nossas terras era assim que se dizia e aqui esta voce, a lembrar-no-los, bem haja!
ResponderEliminarUm abraco amigo e beirao.
Ó Xico, foi você que escreveu isto?!!...Eu estou farta de saber que escreve bem, mas tão bem assim, já é abuso!...:-) Sinceramente, comecei a ler e pensei que fosse algum excerto retirado de alguma obra de um dos nossos ilustres escritores.
ResponderEliminarGostei daquela imagem de ter de escorregar na neve agarrado aos rabos dos cavalos ou das mulas!
Um belíssimo discurso directo. Um texto impregnado da rigidez do Inverno no interior norte do país, com cheiro a terra e a frio. Um primor!
xx
A "culpa" tem nome. Dona Agustinha, minha mae. Maria Augusta Guerra.
EliminarTenho o sonho de dela deixar registo escrito, melhor, transcrito de precaridades de vidas que fui apanhando agarrado nas fraldas do avental, em que guardava um punhado de castanhas assadas no bolso. Tinha de ir jogar a bola e ...
Beijo, amiga.
Faço minhas as palavras da Laura Santos!
ResponderEliminarXico Almeida... qual Camilo, Eça, Garrett ou mesmo Herculano!!!
Gostei muito!
Bom domingo... bem fresco!
Nada disso, minha amiga.
ResponderEliminarFosse a vida mais fidalga comigo...e teria o caminho para o despertar de um sonho, no acordar de coisas vividas. Assim, simples desabafos de anseios de memorias inocentes, mas exuberantes da nossa inocencia.
O "calor" da geada, tem contos infantis...
Um abraco caloroso, Teresinha, minha amiga.
Prosa, com o amigo Xico, está entrelaçada com poesia!
EliminarRealmente é um gosto passar por aqui e ler... ler... ler...
E os seus comentários... gosto... gosto... gosto...
Tenho pena de não escrever o que me vai na mente, apesar dos apelos da família mais próxima serem no sentido de eu tornar legível o que me vai na alma!
E depois? Quem me faria o caril, as empadas... ou ainda a caminha de lavado???
Vou pensar a sério neste assunto!
Um abraço, bom amigo.
Já tenho dito que algumas pessoas da nossa terra deviam ser entrevistadas. Tu, Xico, se o fizeres podes fazer bons 'post's' em formato de entrevista, tens muito jeito ;-)
ResponderEliminarHoje gosto de ver os lameiros e telhados cobertos de geada, mas na minha meninice do que eu gostava era das formas vidradas, pontiagudas, que pareciam estalagmites. Mas a geada é deveras perigosa para quem anda nas estradas das nossas terras frias. Dantes de cavalo ou mula, hoje de automóvel.
A propósito da geada mais tardia e que mata os rebentos e os frutos, há um dito popular que ainda se ouve:
«Em Janeiro sobe ao outeiro, se vires verdejar, põe-te a chorar, se vires negrejar, põe-te a cantar» quer isto dizer que o mês de Janeiro, normalmente é geadeiro, a geada neste mês atrasa o desabrochar por exemplo das videiras, que são muito sensíveis às queimas das geadas. E, se o Janeiro estiver verdejante é sinal que não foi muito frio e é sinal que tudo desabrocha cedo e é sinal que tudo se pode queimar com a geada mais tardia.
Esperemos que estes sinais e ditos antigos ainda tenham validade nos tempos actuais de mudança a tantos níveis!
O está a "cair" uma geada é um termo pertencente à nossa tradição oral. A geada de facto forma-se, não cai, mas nem em todos os lugares é usual "cair".
Parabéns pelo excelente 'post'.
Continua...
Sabes Paula, "isto" para mim nao passa de um cantinho de desabafos, digamos, um lavar de alma para mim e quem me percebe. Como tu, Laura, Teresinha e outros...
ResponderEliminarA Luta e sempre o disse, reside no Blog dos Forninhenses. Tinha e tenho o ensejo de um dia entrar no Centro Social e Paroquial de Forninhos e ouvir os "nossos" idosos, mas se nem me DEIXAM entrar na pagina...
Deve ser por causa da Geada (ou dos Geadas...).
Temos ao menos o sortilegio de ao menos quando vamos ter com as nossas familias, nao necessitarmos de subir ao Outeiro, para ver...
Somos filhos daquele lugar, os primeiros a sentir o calor e frio, os lameiros brancos e olhando para a Matela, saber se nevou ou vai nevar.
O meu falecido pai dizia que eramos os "quintaneiros" e de facto tal parece, este canto da nossa terra tem outra "musica..."
Claro que continuo!
Oi Xico!
ResponderEliminarConcordo com a Laura e a Teresinha, adoro ler seus textos, e considero você um excelente narrador, poeta, um artista!
Nunca pude presenciar e sentir o gostinho de uma geada, mas acho lindo nos filmes e me deixo levar pelo embalo de um bom texto como o seu, é como se já tivesse vivido um dia assim, mas como deves saber aqui onde moro o que reina mesmo é o astro sol e um calor amenizado pela brisa que é bem generosa, ainda bem.
Beijos!
Simpatia sua...mas quem voou cedo do colo da mae, sente de outro modo a distancia, ainda que nao separado por mar, mas aquele frio tem outro sabor, frio seco da serra e ainda hoje nao resisto a ir buscar ao patio mais uma cavaca ou meio rolo de oliveira ao ponto de ao acordar e espreitando para os campos e pinhais, aproveitar as brasas que ainda aquecem. E reacender o fogo...
EliminarLindo. Beijinho.
Xico,
ResponderEliminarSempre gostei a admirei a forma como você escreve e passa as histórias.
A narração é tão perfeita que me levou pra dentro dessa geada. Rs
Aqui onde moro, na Ilha do Norte, não neva, mas faz um frio daqueles.
Gosto de ver geadas nos filmes e fotos. Sinto frio só em pensar, embora ache lindo demais.
Ah Xico, amo ler as coisas que você escreve. Parabéns pelo post.
Abraços
Hoje pensei em si, preocupado pelo momento dramatico que se vivia em Sidney. O sequestro e nas noticias dos media, falaram numa cidada brasileira...
EliminarAte esqueci a geada, confesso. Pronto, passou mas fica o medo...
A geada...das coisas mais belas e puras, como dizer, o casamento perfeito entre o ceu e a terra, uma parte desce enquanto a outra espera e nasce um manto branco que logo ficara vermelho no estalar de uma fogueira.
Faltam oito dias, esta quase...
Beijinho carinhoso!
Meu bom amigo
ResponderEliminar...e que bem me soube esta conversa tão serena e branca de pureza como a geada que vai semeando os lameiros! Urge escrever um livro com tanta sabedoria que enche esses bolsos de harmonia que se vai sumindo! Urge! Aqui respira-se o encanto. Forninhos tão longe do Minho mas com tanta coisa em comum!
Abraço fraterno , querido amigo
....
Em breve postarei uma espécie de rabanadas "modernas" e tão simples, para fazer com a sra sua mãe.
:)
Boa noite Xico, belíssimo este diálogo com a sua santa Mãe, deduzo!
ResponderEliminarUma pérola que li com emoção! Tempos duros, tempos outros e mesmo agora...Uma outra geada vai caindo e destruindo lentamente (?) o que outros levantaram com tanto custo!
Só que neste caso, não há cavacas;)) que nos valham.
Beijinhos,
Ailime
(Como leu acima muitas outras amigas falam da sua narrativa de eleição!)