Foi por esta altura das vindimas que o "Miseravel" apareceu ao cair da noite com malhas no corpo pelo descascar do pelo, coxo e alquebrado, porventura sedento e esfomeado.
Vinha de cima, do alto dos Valagotes e mal entrou na aldeia, quase num ultimo suspiro, nao da alma mas do corpo, encostou ainda no lusco fusco, na paragem da carreira.
Fino, melhor esperto, pois no meio da agonia ainda teve o faro de que ali chegava uma carrinha que tanta barriga enchia, sem um olhar de caridade. Tal houvera, sorte a dele, mas de tal nao era membro.
Chegou a apitar, descarregou e arrancou, ele ali jamais ia caber naquela coisa de gentes, mas porventura e com esperanca, ao lado existe um caixote, do lixo, claro e quem sabe se alguma coisa aprouvesse. Tivera genica para tal.
Cai a noite e mais que esmorecido, recorda num lampejo os fulgores de outrora, tempos em que dominava a serra, os rebanhos e guardava de igual modo o respeito ao patrao, o mesmo que ele lhe dava e devia
Tivera a sua prole bem cuidada, aventureira e audaz, temido em terras galegas, mas as coisas nao correrrm a preceito.
Agora estava num povoado de gentes desconhecidas de caras, mas por ele e os seus ouvidas naquelas conversas da noite, nos montes e penedias, havera gente de bem, coisas tao fortes da vida que ainda bem que nao fala, pois aquilo que ouvia...
Como mataram o Joao do Alecrim com uma sachola e cujo pai andava com a sua mulher, os santos da Senhora pelo padre roubados e o gajo da pide que no coberto da noite inventava coisas sem a aldeia saber para os filhos de Lisboa pagaremn no xilindro...
Um bandido reles.
Adiante.
Por volta das nove, hora de acabar a missa, uma algazarra de caes a ladrar e latir para os lados da igreja, volume que vinha subindo em vertigem rumo ao largo aonde eu e a Perpetua haviamos chegado, quase no momento exato em que o Geraldes erguia a sua faca para finar o Miseravel.
Atrapalhado por da ma fama ser reconhecido, fugiu na noite escura.
E nos dois, canalha aventureira, conseguimos levar este bom cao ate ao patio da minha mae, quase de rastos.
Precisava de cuidados, principalmente comida e bebida e no outro dia se veria, mas o lugar estava ocupado...
Ali vivia o Farrusco!!!
Boa noite.
Bom saber que o "Miserável", pai do farrusco voltou! :-)
ResponderEliminarE a foto foi bem escolhida para ilustrar a canalha aventureira a levar esse bom cão ate ao pátio da tua mãe...quase de rastos.
Estou a gostar muito.
Beijo.
Rico o "Miseravel" na sua dignidade e coragem.
EliminarO que adveio depois de entrar no pateo, ficou registado para memoria futura
nao fora ele tornado cumplice da morte do Joao Alecrim...
Por um lado ficou ufano, pela visibilidade que lhe davam. Um valente!
Por outro, um moribundo cachorro que ja nada podia mostrar.
Pensava tal ate aparecer a tal canalha e...
De sobrolho semi cerrado, lambendo os bigodes encardidos, por ali apanhou acomodo, no canto mais distante, sentindo o arfar do Farrusco e o seu falso rosnar, por vezes mole, por outras capaz de matar, aquando um latir imberbe e mal conseguido, se ia ouvindo...
Adorei te ler, contas muito bem sempre e o final foi feliz!! abração,chica
ResponderEliminarSera final feliz?
EliminarPorventura pelo Natal, digo eu, pois quem conta tem o nome de Farrusco...
De um pai "Miseravel".
Soubera eu fazer essas "coisas"de partilhas e porventura a estoria fosse longa, mas gosto muito do nossos cantinho e do aconchego do mesmo.
Xico, contador de casos e aventuras...
ResponderEliminarMais um capítulo emocionante...
Gostei, viu, você tem muitas emoções a extravasar do Farrusco...
O meu abraço e vi lá a sua resposta a respeito do azeite no bolinho de bacalhau! O meu marido inventa!
Falar na voz do cao, tem por detras uma atitude de honradez e sabedoria.
EliminarNao minha, mas pelo que fui lendo, pois o meu, mais burro que eu...ou nao.
O Farrusco, cao real, tem por pouco que nao queira, ele e eu, muito para contar. E ralhar na vida do homem e do animal, um contra o outro, dependendo do ponto de vista destes dois terrestres.
Isto dos blogues, vou aprendendo que o escrito tem leitura e os comentarios...um acaso de leitura...da maioria.
Aquela dos bolinhos de bacalhau, bem haja esse douto homem, pois sabe ao Olimpo!
Oi Chico!
ResponderEliminarMais uma historia cheia de aventura, que você tão bem sabe contar, adorei!
Beijos!
Ola Fatima!
ResponderEliminarApetece um desafio daqui a uns tempos, mas preciso da vossa ajuda.
Contar mais estorias do Farrusco, do seu pai, o Miseravel e avos ainda esquecidos, tal como a filharada e ...
Vamos juntos contar estorias?
Do mundo que ainda existe, de coisas pequenas, amenas das quais que porque quem por elas passa, nada se vislumbra.
Gostava de fazer um movimento de contar estorias de Farruscos...da vida de miseraveis!
Olá Xico!
ResponderEliminarO Farrusco deixa de ser um personagem canino para ser personagem humano, tal a amplitude de sentimentos de misérias e alegrias de quem vive um dia de cada vez. Torna-sede tal forma simpático que mesmo estando este tempo ausente, quando aqui voltei lembrei uma publicação anterior. E uma vez aí, olhei os caminhos e pensei se ele não teria pisado da mesma forma esse chão.
E as imagens sucederem-se com a simpatia da Sra da Igreja até aos caminhos sinuosos por onde o Farrusco se passearia!
E ficou a saudade
Fraterno abraço!
Digamos que um modo similar de olhar...
ResponderEliminarOs tempos, tal penso, marcam para modular a vida naqueles pequenos e singelos pormenores que anos passados relevamos.Coisas destes malvados tempos que nos cortam o que "esta mesmo ali na mao de semear'. Coisas!
E caminhos, porventura lavrados por sentimentos, orgias e angustias mas, coisas.
As mesmas em que no correr da vida esquecemos por volupia ou insanidade, mas sempre coisas, piores que do Arco da Velha.
Um dia, li os "bichos" do Torga e fiquei indignado. o Gajo roubou os meus sentimentos, embora ele morrido e eu nem nascido, mas...e como a Manuela diz, as tais coisas de caminhos sinuosos por aonde a gente passa...
Na saudade, um fraterno abraco a uma das maiores poetisas do nosso tempo.
Uma honra enorme, minha amiga.
Um pensamento surgiu depois de dar uma volta
ResponderEliminarno tempo.
Aquela volta de cento e oitenta grau que
em dado momento da vida temos que dar uma pausa e pensar.
Eu com certeza tenho o DNA do amor
pulsando no meu coração.
Por isso meu carinho é gratuito e sincero
chego sentir uma saudade que dói mesmo sem conhecer
a amizade além da minha telinha.
A diferença não é o contato fisico,
mas sim aquilo que tenho de mais sublime amar
sem conhecer a cor dos olhos ou da pele .
A religião então ..essa para mim tem somente
um quisito ter fé e acreditar num superior a
tudo com um nome lindo ...Jesus isso me basta.
Um abençoado final de semana.
Eu só vim te dar um abraço é
tudo que posso fazer quando no coração
a saudade vem bater.
Beijos e meu eterno carinho.
Evanir.
Passar por passar é triste mas lendo seu texto percebi o quanto sabe se expressar contando aventuras .
Como se consegue construir um texto com tanta beleza, a partir de um pormenor singelo (e importante), mas ao qual a maioria das pessoas, sobretudo em tempos idos, não daria qualquer importância, ou mesmo que desse, não conseguiria escrever sobre o assunto.
ResponderEliminarUm cão, pai do Farrusco, outrora jovem e forte, depois faminto e miserável. Como os cães podem fazer tão fortemente parte da vida de alguém, e originar tantos anos mais tarde, prosa de elevada qualidade!... Parabéns, Xico, você é um extraordinário escritor! Com raízes na família, na terra e nos animais. E esta pode ser também uma parábola sobre os miseráveis humanos. Tanta gente em todas as épocas tem uma vida de "cão".
Obrigada por tão bela leitura.
xx
Bondade sua, Laura, fico contente por gostar pois vou soltando umas palavras que sinto na alma e quando assim, reina aquela paz interior na quietude de uma latada, sentindo, vendo, a vida em pequenos retabulos, neste caso no abanar contente do rabo do cao.
ResponderEliminarTenho a certeza que percebe.
Beijo amigo.
Percebo, oh se percebo!...:-)
ResponderEliminarxx